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O caso do Peixoto e seu restaurante por quilo

Trago aqui uma história real que parte de algumas conversas e de muita observação, questões fundamentais para um publicitário.
Alias, a partir de agora, irei trazer alguns desses textos.
Peixoto atuou por 23 anos em uma instituição financeira bastante renomada.
Quando desligado da empresa em um corte bastante grande, pensou em abrir um negócio próprio, com a o dinheiro pago pela rescisão.
Estudou, se informou e bem planejou. Abriu então um restaurante por quilo no centro da cidade em que morava.
Um restaurante simples que tinha como público, os funcionários do comércio local.
Me confessou por vezes e em uma dessas conversas, me pareceu orgulhar-se de que o valor cobrado pelo quilo era de R$ 34,90, o mais barato da região.
Para abrir o restaurante, contratou funcionários para a cozinha, atendimento e limpeza. Questões administrativas eram divididas entre ele, a esposa, seus três filhos e seu sogro.
Nas primeiras semanas de funcionamento do restaurante, Peixoto notou que após o horário do almoço, muita comida sobrava. Em especial, muito arroz, feijão e salada. Misturas de um modo geral, eram mais de fáceis para controlar a relação preparo x venda.
Aquilo não poderia ser servido novamente e o destino muito provavelmente seria o lixo. Chamou então seus funcionários da cozinha e combinou que toda a comida que sobraria dali por diante seria igualmente dividida entre todos os funcionários do restaurante, no final da tarde. A alegria de todos foi imensa e Peixoto estava aliviado por ter resolvido a questão de forma mais humana.
Se era para sobrar, que pelo menos, aquela comida fresca não fosse levada ao lixo.
Nas semanas seguintes, Peixoto observou que mais comida sobrava ao término do expediente. E agora, não só o arroz, o feijão ou a salada. Carnes de panela, frangos grelhados e até as batatas fritas também lotavam as tigelas ao término do almoço aos clientes.
Um dos filhos de Peixoto observou em uma conversa com o pai, que com o aumento de sobras tinha relação direta com a ordem de distribuição da comida, feita por Peixoto anteriormente. Ou seja, os funcionários faziam mais comida, para sobrar mais comida e consequentemente, distribuírem mais comida, ao final do dia.
Peixoto reuniu os funcionários e colocou fim a esse ato que havia inicialmente proposto. Dali por diante, as sobras seriam então destinadas aos moradores de rua da região. Era comum, gente ir pedir um prato de comida lá. Desta forma, Peixoto estaria fazendo um bem aos que não tem o que comer.
Ocorre que essa distribuição seria feita diariamente a partir das 15hs, conforme acordou Peixoto com um grupo pequeno de moradores de rua.
Com o passar dos dias, o número de moradores de rua na porta de seu restaurante só aumentava. Pior: cada dia que passava, mais cedo os moradores de rua se concentravam na porta de seu restaurante, afastando a clientela do restaurante.
Peixoto precisava por fim a essa distribuição, pois isso estava impactando fortemente no faturamento da empresa. Assim o fez, ou seja, cancelou a distribuição e por algumas semanas, Peixoto ainda teve de enfrentar a ira de alguns moradores de rua que não se conformavam com a decisão. Alguns diziam que “pior do que negar um prato de comida, era dar um prato de comida com uma mão e tirar com a outra”.
Peixoto estava ficando preocupado e entre nós aqui, bastante puto da vida.
Orientado por sua esposa, procurou pela Internet algum orfanato no bairro que cuidasse de crianças carentes. Achou dois e foi conhecê-los.
Peixoto concluiu que em um deles, a gestão era mais clara, transparente e humana. Visão do Peixoto, sei lá os motivos.
Com muito cuidado para não parecer “esmola”, Peixoto ofereceu à administradora do orfanato, as comidas diárias e de qualidade que sobravam em seu restaurante. O aceite foi imediato e Peixoto também assumiu a responsabilidade de levar, com seu próprio carro, todas as tardes, a comida até o local.
Foram meses assim e o problema parecia estar resolvido de uma vez por todas.
Certo dia, tocou o telefone do restaurante e Peixoto atendeu. Era do orfanato. Segundo a moça que ligara, uma das crianças havia passado mal naquela tarde e então levada ao pronto socorro. O diagnóstico: infecção alimentar.
Pronto, ainda que aquelas crianças se alimentassem de alimentos que não eram do restaurante, a culpa foi toda para a comida do Peixoto.
História contada do orfanato para a Prefeitura, que acionou a Vigilância Sanitária que ficou procurando literalmente “pêlo em ovo” na comida do restaurante do Peixoto por meses e meses.
Hoje, a ordem do restaurante do Peixoto é jogar a comida fora. Deve ser difícil para Peixoto, que tanto tentou ajudar ao próximo.
Com olhos lacrimejados, Peixoto me conta a história com ar de derrota, dizendo obviamente durante todo esse período, criou regras para minimizar as sobras, mas que isso não é matemático e que sofre com cada grão de arroz que sobra.
Segundo ele, seus mais de 20 anos trabalhando em um Banco não serviram muito para administrar um restaurante e em nada, nada mesmo para entender o ser humano.
Peixoto é real, o restaurante é real. Só o quilo que agora é R$ 43,90.

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