Sou um dos mais de 2 milhões de espectadores que assistiram Auto da Compadecida 2, uma obra inspirada no livro Auto da Compadecida (1955), de Ariano Suassuna. Você pode ver o filme apenas pela diversão, sem referências, e ele será puro entretenimento. Mas ele fica ainda mais especial quando se entende o contexto e tudo o que o envolve.
Começaria falando de Ariano Suassuna, que é um dos mais importantes escritores, dramaturgos e pensadores brasileiros. Natural de João Pessoa, na Paraíba, ele é reconhecido por suas obras que valorizam a cultura nordestina e o folclore brasileiro. O Auto da Compadecida é sua obra mais famosa; ela mistura elementos da literatura popular e da religiosidade nordestina com muito humor.
Não tive a honra nem a oportunidade de conhecer ou ouvir Ariano em vida. Ele nos deixou em 2014, mas ele e sua sabedoria falam comigo através de seus vídeos no YouTube. Me encantam suas tiradas e suas histórias. Ele é um contador de histórias que defende a cultura brasileira, nossa língua e nossa gente. Recomendo que você assista a alguns desses vídeos. Basta buscar pelo nome dele, e tenho certeza de que você vai se divertir muito.
Este gênio nos presenteou com a história de seus conterrâneos, numa riqueza de detalhes que espelha as pessoas do Nordeste, do sertão. Ele nos deu dois presentes. Arrisco dizer que Chicó e João Grilo são os nossos dois maiores heróis, pois retratam a beleza do nosso povo e sua sabedoria simples, em grande parte pela vivência, um dos traços mais bonitos da experiência humana, que é se permitir conhecer a identidade das pessoas, apenas provocando que elas nos falem de fato quem são.
Se você nunca esteve pelo Nordeste, pode perder parte do contexto. Eu morei por 1 ano e meio em Fortaleza e depois trabalhei por cinco anos com o povo baiano em uma das suas principais festas: o Carnaval de Salvador. Sou apaixonado por este povo. Eles me deram muito e me ensinaram através de todas as suas lutas. Alguns dizem que Chicó e João Grilo são sobreviventes. Eu entendo isso, mas penso que é pouco. Eles são a tradução da alegria que descobri nas pessoas mais simples do nosso Nordeste. Este povo que ri com pouco, pois é um povo grato, que sabe valorizar os pequenos detalhes que a vida nos entrega.
Se você ler o livro, a dimensão do entendimento do filme ficará maior, e talvez assim você perceba a riqueza de Ariano Suassuna. A construção dos diálogos é um primor, uma aula de redação. Um trabalho que revela uma cultura tão especial e tão brasileira, mas que, ao mesmo tempo, parece tão distante de nós.
Por favor, não se contente com resumos. Não consuma as coisas de forma apressada entre um clique e outro. Seu repertório é construído toda vez que você se detém diante de algo para saborear. Esta cultura do instantâneo que nos absorveu trouxe pouca coisa boa e gerou uma falta de desenvolvimento de profundidade nas ideias.
Tudo isso que apresento a vocês é um pouco da cultura do nosso povo, uma fração, mas, na verdade, um todo. Construa pensamentos a partir do que você consome; tudo isso se refletirá em suas criações.
Está em dúvida? Confira o filme de 3 minutos que a Brahma fez para aproveitar o lançamento do filme, um trabalho da Africa Creative. Este material tem diferentes leituras no Brasil, mas pode ter certeza de que no Nordeste ele é mais acolhido.
Gosta de criar? Construa o seu repertório.
Gostou do conteúdo? Acesse nossa home e veja mais.
Acompanhe também nosso perfil nas mídias sociais.