Como publicitário e como professor de disciplinas de planejamento, eu sempre me deparei com a questão: como fazemos nossas escolhas? Alguns planos que li na carreira carregavam na tinta para dizer que vamos conquistar consumidores e fazer com que tomem as decisões que queremos que tomem.
Para quem ainda insiste nisso sem cuidado, eu recomendo lembrar quantas vezes sua mãe te pediu para arrumar seu quarto, e de como isso é tão difícil para diversas pessoas.
Antonio Damasio é um neurocientista português, professor da University of Southern California (USC), conhecido mundialmente por seus estudos sobre a relação entre emoção, razão e tomada de decisão. Me ajuda a começar a falar desse assunto com você.
Em muitos momentos, não somos nós que escolhemos — são nossas memórias emocionais que escolhem por nós. Fomos moldados por conexões afetivas, traumas, vínculos, aprendizados — tudo que formou nosso repertório emocional ao longo da vida.
Pense comigo: você de fato escolheu a marca de refrigerante que mais gosta? Ou, um dia, sem nem se dar conta, se viu bebendo uma marca, fazendo escolhas por ela ou, mesmo, não tomando nenhum refrigerante? Em geral, é em nossa família que adquirimos muitos dos nossos hábitos, e quebrar esse ciclo é muito difícil.
O interessante é que, quando pensamos numa marca de refrigerante, isso fica bem simples. Mas nossas famílias nos deram uma base cultural que será referência nas suas decisões — e, em muitos casos, você nem vai perceber.
Gosto, muitas vezes, de avaliar uma decisão de compra que faço. Tento analisar os pontos de decisão tomados e entender o motivo que me fez optar por um produto e sua marca. Muitas vezes, me dou conta de que somos, por demais, emocionais.
São nossas conexões que definem nossas crenças, atitudes e, muitas vezes, nosso estilo de vida. Num primeiro momento, temos nossa família, que nos dá essa primeira camada de gostos e opções, mas depois temos uma grande influência a partir dos relacionamentos que construímos ao longo da vida.
Nosso grupo de amigos é uma força de influência ainda mais relevante. Percebo que, quando um jovem garoto não tem a referência do time de futebol de seu pai — em muitas vezes por ele não gostar do esporte — será um amigo ou uma pessoa próxima que vai transferir essa paixão. Uma decisão tão forte que vai seguir com você para o restante da sua vida. Particularmente, conheço poucas pessoas que trocaram de clube do coração ao longo da vida — e as que conheço fizeram isso ainda muito pequenos.
Novamente, é meu papel confrontar: você de fato escolheu o time que torce? Ou foram as pessoas que te amam que te inspiraram a se apaixonar por um clube? O interessante é que essa, muitas vezes, é uma convicção que nos segue por toda a vida.
Vou me valer de outra referência: o psicólogo social norte-americano Kenneth Gergen, uma das principais vozes do construcionismo social — abordagem que entende a realidade como algo que construímos por meio das interações sociais.
Muitas das nossas escolhas não surgem sozinhas, elas são frutos dos vínculos que mantemos. Para Gergen, em certos momentos, não somos nós que escolhemos o caminho — é o caminho, moldado pelas nossas conexões, que nos escolhe.
Gosto de lembrar isso a jovens publicitários, pois temos a ousadia de dizer, em nossos planos, que vamos mudar o comportamento das pessoas, que vamos fazer um consumidor mudar de ideia — mas te lembro que isso é muito complexo e difícil de fazer.
Fazemos escolhas todos os dias, e muitas delas são tão rápidas, intuitivas e automáticas que não nos damos nem conta. Como planejador, eu sempre gostei de ficar no varejo observando os momentos de compra. Já passei dias vendo como as pessoas escolhem sapatos ou compram equipamentos — isso, para mim, é sempre um grande aprendizado.
Da próxima vez que estiver no supermercado, repare quanto tempo, em média, uma pessoa demora para escolher um produto numa gôndola. Você ficará surpreso que, em alguns casos, são segundos — e, em relação a algumas marcas, a pessoa nem mesmo se dá ao cuidado de olhar o preço.
Não quero te desestimular a pensar em suas escolhas — quero apenas te mostrar que mudar comportamentos requer muito trabalho e tempo. Mesmo quando nossas escolhas parecem determinadas por fatores externos ou relações, a forma como nos posicionamos diante delas é sempre uma escolha.
Alguns têm maior ou menor consciência sobre isso, mas, em grande parte, nossas escolhas são heranças das conexões que temos. Vou sempre agradecer aos amigos por me apresentarem músicos e bandas, e por ampliarem minha consciência com outras atividades que passaram a fazer parte da minha vida.
Somos, em grande parte, fruto das escolhas que fazemos.
Gostou do conteúdo? Acesse nossa home e veja mais.
Acompanhe também nosso perfil nas mídias sociais.