No início da minha carreira na propaganda, como assistente de mídia em uma pequena
agência, pude compreender a importância do planejamento e das compras de mídia para
realmente entender quem consome o meu produto e a relevância da correta identificação
do público-alvo. Sempre me incomodei quando, em uma reunião, o cliente ou alguém da
agência afirmava de imediato que todo mundo consome o produto. Cada vez que ouço
isso, tenho a certeza de que falta conhecimento sobre o produto.
É claro que, ao pensarmos em produtos como água, é fácil assumir que todo mundo é um
potencial consumidor, mas é nesse momento que profissionais de mídia e planejamento
experientes elevam o nível de entendimento do plano, pois é crucial saber quem
realmente compra o produto.
Quando lecionava, costumava usar dois exemplos para ampliar o conhecimento sobre
padrões de consumo. Perguntava a alguns meninos da classe se já haviam comprado
cuecas alguma vez na vida. Parece estranho, mas é possível que um rapaz entre 18 e 21
anos, geralmente o público médio das faculdades, chegue até essa idade sem nunca ter
comprado cuecas. O interessante é que ele pode continuar não comprando ao longo da
vida, pois é provável que essa compra sempre tenha sido feita por sua mãe, e após o
casamento, sua futura esposa pode assumir esse consumo.
Um bom profissional de mídia sabe que o consumidor muitas vezes não é o comprador, e
em muitos casos, é muito mais eficiente concentrar o foco e o esforço de mídia no
comprador, pois sua resposta ao estímulo da comunicação é muito maior.
O segundo exemplo que costumava usar era o das Havaianas, um dos produtos de maior
sucesso na história da publicidade brasileira, que em algum momento teve como slogan
“todo mundo usa”. Aqui, o efeito de comprador e consumidor não é tão relevante na
análise do plano; o destaque vai para outro conceito importante: precisamos pensar nos
“heavy users”, ou seja, aqueles que utilizam um produto ou serviço com muita frequência.
Quando perguntava a um grupo aleatório quantas pessoas tinham um par de Havaianas
em seu guarda-roupa, era provável que 98% a 100% afirmassem possuir um par. No
entanto, a questão muda quando perguntamos quantos pares os homens têm,
geralmente resultando em uma resposta entre 1 e 1,5 par. Existem exceções, mas é
comum que um homem tenha um ou dois pares no máximo. Já quando perguntamos às
mulheres quantas Havaianas elas possuem, a média é de 5 ou mais, pois as mulheres
tendem a consumir Havaianas como um produto de moda.
O conceito de “heavy user” nos permite concentrar o esforço da campanha em escolhas
de mídia mais voltadas para o público feminino, já que ao trabalhar com esse público,
teremos uma maior eficiência no volume de vendas. As mulheres são mais propensas a
comprar um novo modelo, enquanto os homens geralmente só consideram a compra
como substituição.
A eficiência de um plano muitas vezes está na definição de uma estratégia que rentabilize
os esforços. Por mais rico que seja o cliente, todo plano de mídia tem um limite de
esforço estabelecido pelo orçamento, portanto, o bom trabalho de mídia está em
identificar as características de um público que permitam encontrar focos de conversão
mais eficientes
Um bom trabalho de mídia requer uma boa interpretação do público-alvo no briefing. Na
minha experiência, sempre gostei de visitar o varejo e observar um comprador em uma
loja ou supermercado. Sempre me surpreendeu a quão rápida é a decisão de compra no
ponto de venda, uma demonstração clara de que nem sempre é fácil mudar um
comportamento. Nossa tarefa muitas vezes é muito difícil. Essa observação no varejo
também me permitia ver quem realmente compra o nosso produto.
Recentemente, participei de um debate sobre TV conectada, e o painel demonstrou que o
consumo de YouTube na televisão é muito alto. O grupo, composto por pessoas de classe
média e alta, não compreendeu o motivo desse consumo ser tão elevado. A experiência
de consumo do grupo atrapalhou o entendimento do padrão de consumo dos
consumidores.
Para famílias das classes B, C e D, é comum que o dispositivo de acesso mais fácil ao
YouTube seja a televisão. Além disso, a maioria dos televisores vendidos no Brasil já vem
com o aplicativo do YouTube instalado, facilitando o consumo neste aparelho.
Portanto, um bom profissional de mídia precisa se libertar de sua própria experiência e
entender quem é o consumidor sem preconceitos. Um bom plano de mídia é feito a partir
do entendimento do consumidor. Sempre que possível, converse com consumidores,
faça imersões. Quanto mais próximo do consumidor estiver, mais eficiente será sua
estratégia em seu plano de mídia.
Uma boa característica de um bom planejador de mídia é a curiosidade sobre a jornada
de consumo. Entenda que todos os dias podemos aprender mais com nossos
consumidores.
Invista em você, invista na sua carreira.
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