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Fonte: Reprodução Unsplash

A ignorância é um filtro

Guimarães Rosa nos presenteou com Riobaldo no livro Grande Sertão: Veredas, com a oralidade do sertanejo: “Eu quase que nada sei. Mas desconfio de muita coisa.” Essa semana gastei um tempo pensando nisso. Sempre me impressiona a confiança das pessoas em falar de coisas que de fato não conhecem, ou que conhecem muito pouco.

É essa confiança simples que Guimarães traz para seu texto que faz pensar que a ignorância é um filtro que nos protege do embaraço, da vergonha, mas que também limita o nosso aprendizado.

Passeando pelas redes sociais, me vejo cercado de especialistas.

Parece que uma consulta rápida ao Google é melhor que 8 anos de curso de medicina, ou que um prompt bem-feito no ChatGPT pode esclarecer os mistérios do universo. Receio que a ignorância seja o filtro que nos leva a pensar que tudo pode ser rapidamente acessado e aprendido.

Talvez um dia a distopia do filme Matrix (1999), em que o conhecimento passa a ser instalado diretamente no cérebro por meio de downloads instantâneos, sem necessidade de estudo ou prática, seja viável. Eu duvido muito.

Pesquisando sobre o assunto, descobri um estudo clássico da psicologia social que deu origem ao termo “efeito Dunning-Kruger”. Os pesquisadores queriam entender como pessoas com baixo desempenho em certas tarefas avaliam a própria competência. A hipótese era que a falta de habilidade também impede o indivíduo de perceber a própria ignorância. O estudo mostrou que, quanto menos alguém sabe, mais confiante tende a ser na hora de falar. Quando o natural deveria ser exatamente o contrário.

Pesquisas em psicologia cognitiva mostram que os seres humanos têm uma tendência natural a acreditar que sabem mais do que realmente sabem. Isso leva à construção de narrativas firmes, mesmo quando faltam dados ou evidências.

Esses estudos explicam muita coisa, pois é incrível como algumas pessoas se apegam a ideias simples, sem nenhuma base ou estudo.

Se colocarmos a janela que as redes sociais abriram para que todos fossem produtores de conteúdo, os efeitos são ainda maiores. Estudos em comunicação de Zeynep Tufekci e Cass Sunstein apontaram que plataformas digitais amplificam esse comportamento. As pessoas ganham visibilidade e reconhecimento ao expor opiniões, mesmo sem embasamento. Likes e compartilhamentos funcionam como reforço positivo.

Gosto de provocar as pessoas com perguntas e percebo que a grande maioria tem receio de mostrar ignorância sobre um assunto. Elas se escondem atrás de suas opiniões, não se dando conta de que, em muitos casos, estão fazendo papel de bobos.

Durante muitos anos, em minhas turmas, provoquei meus alunos com uma questão: imagine que eu queira saber o quanto você domina um assunto. Que tipo de pergunta eu devo lhe fazer para ter certeza de que você tem conhecimento sobre ele?

Gaste alguns minutos pensando nisso. Que pergunta pode me permitir saber o que de fato você sabe sobre um determinado conhecimento? Como posso ter certeza do seu domínio com algumas perguntas?

A resposta é bem simples, mas costuma demorar para aparecer: eu devo perguntar aquilo que eu sei sobre o assunto, pois assim terei condições de validar sua resposta. Em minha experiência, chega a ser constrangedor quando perguntamos para alguém sobre um assunto e damos a entender que não sabemos nada sobre ele. É incrível como as pessoas tendem a ser criativas em suas respostas.

Me preocupa o impacto desse comportamento, pois vejo uma redução da curiosidade. As pessoas se contentam com resumos, com reduções, e assim limitam sua experiência de conhecimento.

Quando estiver com alguém que domina muito um conhecimento, crie oportunidades para conversar com essa pessoa. Faça perguntas, aprenda o máximo que puder. Se posso te dar um truque simples, eu tenho dois cuidados quando vou estar com alguém assim: primeiro, faço uma boa pesquisa e, em seguida, elaboro perguntas. A maior parte das pessoas gosta muito de falar sobre seu conhecimento, e perguntas são a chave para uma conversa muito especial.

Que sua ignorância seja um alerta para a busca por mais conhecimento, não se contente com aquilo que você sabe. Aprendi com o tempo que nunca vamos dominar totalmente um assunto, pois todos os dias seremos surpreendidos com ideias novas e com a ampliação do conhecimento — se tivermos o cuidado de ter uma predisposição de aprender sempre.

Sucesso na carreira!

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